Unidade 731
As armas químicas e biológicas são os mais terríveis instrumentos de destruição em massa. Com baixo custo e de fácil produção, são capazes de dizimar o inimigo, envenenar colheitas, e deixar gerações doentes e deformadas entre os que conseguem sobreviver. Tudo isto, a um custo infinitamente menor que o armamento nuclear e sem a necessidade de grandes desdobramentos de tropas.
No final de 1947, os serviços de inteligência dos EUA estavam prestes a conseguir estas armas apocalípticas. Através de acordos secretos com Shirô Ishii, chefe da Unidade 731 – a equipe responsável pela guerra biológica japonesa –, tornaram conhecimento em pnmeira mão dos efeitos que numerosos agentes biológicos causavam nos seres humanos.
As horríveis histórias que os sobreviventes contaram foram encobertas para evitar “incômodos” a Ishii e seus colaboradores, e os governos ocidentais concederam imunidade a todos os membros da Unidade 731 para poderem ter acesso às suas descobertas. Como expõe friamente um relatório do Pentágono de dezembro de 1947: “Tais informações não poderiam ser obti-das em nossos laboratórios em razão dos problemas morais inerentes às experiências com humanos. Estes dados foram obtidos com um investimento de 250.000 dólares, muito barato...”.
CULPA SECRETA
Por este pequeno preço, os governos britânico e norte-americano, obtiveram exausti-vos detalhes dos efeitos da guerra biológica nos seres humanos. Receberam também, relatórios de autópsias ao vivo, dissecações em fetos e bebês, além de um meticuloso estudo sobre sintomas da peste, do tifo, do-enças venéreas, varíola, gangrena, salmonelíase, escarlatina, difteria, tétano, coqueluche e inúmeras doenças atrozes. O fato do Ocidente ter permitido que Ishii ficasse impune, constitui um dos segredos mais obscuros da Segunda Guerra Mundial, e permaneceu arquivado como informação secreta durante mais de 30 anos.
Sabendo que as doenças podiam ser os agentes biológicos ideais, os governos ocidentais começaram um programa na base de ataques “suaves” em algumas de suas cidades mais importantes, para determinar os métodos mais eficazes de contaminação em massa.
Quando a Guerra Fria se iniciou, o Pentágono começou a temer que um submarino soviético pudesse entrar em suas águas, liberando uma nuvem de bactérias e desaparecendo antes que a população percebesse que tinha sido contaminada. Dessa forma, em setembro de 1950, dois patrulheiros da marinha, na baía de São Francisco, lançaram uma nuvem de Serratia marcescens, uma bactéria relativamente benigna desenvolvida nos laboratórios de Port Down no Reino Unido.
COBAIAS HUMANAS
Depois de seis destes ataques “suaves”, percebeu-se que 300 km2 da área de São Francisco tinham sido infectados e quase toda a população havia inspirado a bactéria. Essa experiência provava que uma importante cidade era totalmente incapaz de defender-se de uma contaminação em massa, provocada por uma bactéria difundida através do ar.
No final dos anos cinquenta, a exército dos EUA tinha realizado experiências em Savannah (Geórgia) e Avon.Park (Flórida). Grandes quantidades de mosquitos foram lançadas por aviões em zonas residennais, uma técnica da Unidade 731. Muitos residentes ficaram doentes, outros morreram.
Em seguida, militares, disfarçados de funcionários da saúde pública, realizaram testes médicos nos infectados. Ainda que os detalhes dessa experiência continuem sendo secretos, acredita-se que os mosquitos eram portadores da febre amarela, um vírus que provoca febres altas e vômitos e causa a morte de um em cada três infectados.
Outros testes realizados para comprovar a vulnerabilidade das cidades aos ataques biológicos foram realizados no Reino Unido, Canadá e EUA, culminando com um ataque à cidade de Nova Iorque em 1966. Agentes do Chemical Corps Special Operations Division, borrifaram, através das grades de ventilação das estações de metrô, a bactéria Bacillus nas horas de maior movimento. As turbulências criadas pela passagem dos vagões, demonstrou que esse era um meio perfeito para propagar as bactérias por toda a cidade.
DESTRUIÇÃO MÚTUA
O “ataque” infectou quase um milhão de pessoas e mais uma vez, foi comprovado que não há forma de defender-se de um ataque inimigo. Tomando conhecimento disto, os EUA deram um passo adiante e dedicaram-se à pesquisa de aplicações militares: a possibilidade de sobreviver a um ataque inimigo ou pelo menos a mútua destruição através de infecções em massa teriam que estar garantidas.
Os conhecimentos adquiridos não foram utilizados para fins militares até a guerra da Coréia. Em uma noite, os habitantes do povoado de Min-Chung ouviram um avião sobrevoar seus telhados. Quando acordaram descobriram um grancle número de ratos-do-mato, a maioria deles mortos e muitos com as patas fraturadas.
Aterrorizados, os homens da aldeia mataram e queimaram os roedores, exceto quatro deles. Testes comprovaram que estavam infectados com a peste bubônica. Uma comissão internacional investigou este e outros incidentes semelhantes, publicando suas conclusões no Relatório da Comissão Científica Internacional sobre as ações relativas à guerra bacteriológica na Coréia e na China. Em relação ao incidente de Min-Chung, o relatório informa: “Não há dúvida de que um grande número de ratos-do-mato infectados com a peste bubônica foram lançados no distrito de Kan-Nan, durante a madrugada de 5 de abril de 1952, desde o avião que os habitantes ouviram. O avião foi identificado como sendo um F-82, um caça noturno de dupla fuselagem norte-americano”. O governo dos EUA negou as acusações.
MORTE NA SELVA
A guerra biológica apareceu novamente na guerra do Vietnã. O exército dos EUA utilizou desfolhantes para assolar as selvas nas quais os Viet Congs se refugiavam. Destrui:u plantações para desmoralizar os inimigos e seus simpatizantes. Pesquisaram-se aproximadamente 26.000 variações de herbicidas e desfolhantes para serem utilizados no sudeste asiático.
Destas substâncias, foram escolhidas seis para devastar a selva. Foram chamadas de Agente Púrpura, Verde,Azul, Branco, Laranja e Rosa, dependendo da cor de seus componentes. De todas elas, o Agente Laranja era o mais poderoso e foi utilizado para devastar as áreas cuja vegetação era mais densa. O produto era um composto do desfolhante 245-T, desenvolvido na Inglaterra e uma pequena quantidade de dioxina; a combinação acelerava o crescimento de árvores e arbustos de forma que o seu próprio peso as destruía. Também produzia efeitos terríveis sobre os humanos.
A operação “Ranch Hand’ consistiu em espalhar Agente Laranja em uma área de 50.000 km2. No final da guerra haviam sido lançados sobre o Vietnã mais de 110 kg da dioxina que fazia parte da composição do Agente Laranja (85 g da letal toxina depositados no abastecimento de água de Washington seriam suficientes para matar seus habitantes). Nos recém-nascidos apareceram horríveis deformações, triplicaram os casos de bebês com lábio leporino e espinha bífida e o número de bebês nascidos mortos duplicou.
Em resposta às denúncias feitas pelos médicos de Saigon, o Pentágono insistiu em dizer que a utilização de produtos químicos para destruir a vegetação da selva não violava nenhum tratado internacional. Apesar dessa atitude, era óbvio que os efeitos da desfolhação foram muito mais longe que a mera devastação da selva, e os norte-americanos que se opunham à guerra do Vietnã, pressionaram a proibição do Agente Laranja. Em 1977, o governo cedeu e foi publicada a Convenção de Armas Biológicas, na qual ficava proibida a guerra biológica considerando que era “incompatível com a consciência da humanidade”. As experiências, no entanto, continuaram secretamente.
UMA NOVA GUERRA
Encaradas como “a bomba atômica do pobre”, as armas biológicas são uma opção atrativa e barata. Durante a guerra do Golfo, as forças aliadas foram muito cautelosas com os possíveis ataques, já que a combinação das altas temperaturas com a pele suada tornava os soldados muito vulneráveis aos agentes biológicos.
Antes da invasão do Kuwait, sabia-se que o Iraque tinha armazenado inumeras armas biológicas O arsenal incluía 28 mísseio SCUD carregados com gás Sarin, 800 bombas de gás nervoso, 60 toneladas de gás nervoso Tabun e 250 toneladas de gás mostarda, e não foi destruído pelo bombardeio em massa do aliado. Depois dos ataques com armas biológica no setor curto do Iraqui, no final dos anos oitenta, suspeita-se que Saddan Hussen pode ter feito experiências com estas armas contra as forças aliadas.
TERROR NO METRÔ
Se o uso de armas biológicas em um contexto militar é alarmante, pensar que grupos terroristas possam ter acesso a elas e usá-las em populosos centros urbanos, inspira pavor. Um recente incidente dessa natureza alarmou o mundo inteiro. Em março de 1995, o atentado com gás Sarin no metrô de Tóquio, cometido por membros da seita Aum Shinriyko, provocou 12 mortes. Se a mistura química e o sistema de difusão tivessem sido um pouco diferentes, o número de mortes teria sido muito maior.
Agora se sabe que a seita Aum Shinriyko pregava a destruição do Ocidente, e as armas biológicas poderiam ter sido facilitadas pela Rússia desejando conseguir ajuda financeira no Japão. Acredita-se que a seita auxiliada pelos serviços secretos russos, pôde ter sido acesso às indústrias químicas russas.
Por causa da expansão do crime organizado na Rússia, as potências Ocidentais temem que as armas biológicas possam ser adquiridas no mercado negro. É muito fácil escondere transportar os mesmos elementos necessários para realizar o atentado de Tóqui. Dois produtos químicos inofensivos podem ser misturados para transformarem-se em agentes mortais, o que significa que em teoria, estão ao alcance de qualquer organização decidida a obtê-los.
UM NOVO TIPO DE GUERRA
Parece absurdo pensar que a Inglaterra e os Estados Unidos, quando decidiram manter em segredo as atividades da Unidade 731, podiam prever estas ameaças da guerra biológica moderna. Contudo, fazer experiências com armas potencialmente tão destrutivas, poucos anos depois das devastadoras explosões de Hiroshima e Nagasaki, é um fato que desafia a lógica.
Fonte
Revista "Fator X" Volume 1 Páginas 175-179
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